quinta-feira, fevereiro 02, 2006

O assalto

Tenho um assunto muito mais interessante para vos falar do que um filme. Hoje tentaram assaltar-me. Jantei num restaurante no Rato. Desci pela rua de S. Bento enquanto a chuva se adensava progressivamente. Abriguei-me na entrada de um prédio próximo e do mesmo lado da casa da falecida Amália Rodrigues.
A chuva caía serena, mas consistente. Aquele recanto não podia ser visto da rua, que de resto estava deserta. Eu olhava para o alto, assistia descontraidamente ao efeito da iluminação pública na água que descia. Quando de repente, como que vindos do nada, surgem por baixo de mim dois rostos tenebrosos, assombrosos, desesperados.
Um deles, dos seus vinte e poucos, ao meu lado esquerdo, puxou-me abrutalhadamente a pasta do computador com uma mão, com a outra simulava ter uma faca que, na verdade não era uma faca, mas sim um porta-chaves com uma medalha prateada. O outro enfiava-me as mãos dentro dos bolsos e repetia insistentemente: “telemóvel, telemóvel, telemóvel, carteira, carteira”.
Eu estava assustadíssimo. Disse que lhes ia dar o telemóvel, mas que tinha anos de trabalho na pasta (no computador portátil). Dar-lhes-ia o dinheiro também, cerca de 180€ que tinha levantado para pagar a renda de casa. Pedi-lhes que tivessem calma, empurravam-me de lado para lado, tentavam-me meter novamente as mãos nos bolsos.
Por uma mera fracção de segundo fiquei tranquilo. Extremamente tranquilo. Olhei-os nos olhos. Tinham muito mais medo do que eu. Senti que, apesar do meu porte frágil, era muito mais forte do que eles. Agarrei um com cada uma das mãos e cuspi-os como migalhas para o meio da rua.
O mais novo deles correu com o computador às costas. Em dez passadas fiquei a dois metros dele. Largou o computador. Eu baixei-me para o pegar. Parei e fiquei no meio da rua de S. Bento a gritar com tudo o que tinha: “Venham cá agora! Então onde está agora a vossa coragem? Venham cá!”
O dono do restaurante mais próximo fechou a porta por dentro e retirou-se para próximo do balcão. Expliquei-lhe o que se passou. Estava extremamente exaltado.
Isto aconteceu-me mesmo e julguei mais interessante escrever sobre isto do que sobre o Libertino. Perdoem-me a pessoalidade desta entrada. Mas foi a primeira vez que me tentaram assaltar.

2 Comentários:

Anonymous Anónimo Escreveu...

GRANDEZA DO HOMEM

Somos a grande ilha do silêncio de deus/
Chovam as estações soprem os ventos
jamais hão-de passar das margens
Caia mesmo uma bota cardada
no grande reduto de deus e não conseguirá/
desvanecer a primitiva pegada
É esta a grande humildade a pequena
e pobre grandeza do homem

in AQUELE GRANDE RIO EUFRATES
de Ruy Belo

A maldade é deles.
Mas a coragem é tua.
: )

3/2/06 12:57  
Blogger rodrigueswilson Escreveu...

Quando cheguei a casa, encharcado de quanta água havia, julguei que não iria dormir bem. Estava exaltado. Deveria estar inundado de adrenalina e outras substâncias estimulantes. Escrevi o texto de uma só rajada. Tomei banho em água morna e julgava que durante horas não ia pregar olho.
Deitei-me. Dormi mesmo bem. Às sete e meia levantei-me e hoje já escrevi mais de duas páginas, ainda o dia vai a meio. Digamos que de ontem para hoje dupliquei a “pedalada”.
Sou um sortudo, até os assaltos me fazem bem!
:)

3/2/06 13:58  

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